28/11/11

Graçolas

O meu avô pintava pardais de amarelo e depois mandava-os vender como se fossem canários.
Escolhia rigorosamente – não os pardais – mas as vítimas da trapaça: entendidos em canto do Harz, ornitólogos curiosos e avicultores com licença, criadores de aves domésticas e mesmo um ou outro patrício alheio à ciência das aves.
Tais destinatários tinham um denominador comum: de doutos nada tinham, embora vertessem saber pelos cafés da terra. Naturalmente, havia queixas: “Que não canta, Miguel! Que não canta!”; “Há-de cantar, há-de cantar!”; até que uma repentina chuva ou a mudança de penas punha a descoberto o engodo e o tom do original.
Meu avô gostava de “pregar partidas”.
Sem nunca ter lido o Livro do Riso de Aristóteles, e muito menos Umberto Eco que o inventou já ele tinha morrido, sabia, intuitivamente, que “se o homem das cavernas tivesse sabido rir, o curso da História teria sido diferente”, Oscar Wilde.
Imaginemos agora por um momento que os cave people trocavam graçolas enquanto caçavam mamutes.
Aposto que largariam umas boas gargalhadas se vissem o tão falado vídeo da Sábado, uma colectânea de asneiras proferidas por estudantes universitários.
Deixemos de lado a manipulação das imagens e o “vale tudo” da sobrevivência. Rir de quê? Da miséria cultural dos entrevistados? Se for isso, melhor fariam em chorar porque algum deles ainda chegará ao poder (“In my flifetime, we’ve gone from Eisenhower to George W. Bush. We’ve gone from John F. Kennedy to Al Gore. If this is evolution, I believe that in twelve years, we’ll be voting for plants”, Lewis Black).
Se for para insinuar que o ensino público só produz ignorantes e que isto era muito melhor quando era cada um em su sitio, uma pergunta para os responsáveis da peça.
Quem foi o presidente da República que disse: “Comemora-se hoje em todo o país uma promulgação do despacho número 100 da Marinha Mercante Portuguesa, a que foi dado esse número não por mero acaso, mas porque ele vem na sequência de outras 99 anteriores promulgações”?
Um canudo em comunicação social a quem souber a resposta.

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