30/11/10

A queda em directo e ao vivo


Apesar do tom “telenovelesco” da maior parte dos documentos diplomáticos norte-americanos que têm chegado a público, cedidos pela Wikileaks, um assalto desta dimensão não é para brincadeiras.
Anda tudo a assobiar para o lado, com poucas excepções (uma foi Chávez que já veio dizer as coisas do costume), mas que os EUA se expuseram ao ridículo expuseram.
Podem os próprios — e os visados nos telegramas — fazer diplomaticamente de conta que continua tudo bem. No fundo, no fundo, estamos a assistir ao vivo e em directo à queda de um Império.
The times they are a-changin. Ou como bem disse o Tom Waits, "estamos no meio de uma revolução [só que desta vez] ninguém sabe de que lado vêm as pedras".

26/11/10

Diálogos ao final do dia

— Que dia é hoje?
— Quinta.
— Já?!
— Já. Como tem estado a dormir o tempo passou mais depressa…
— Se calhar injectaram-me com pentatol…
— Pentatol?!
— Sim. O que usava o KGB e a CIA…
— Que disparate! Eles aqui já não usam disso.
— Tens a certeza?
— Quase que apostava. Mas quer que pergunte?
— E achas que eles iam dizer? (risos)
— Pentatol! Vai lembrar-se de cada coisa!
— Pentatol, sim senhor. O soro da verdade.
— E para que é que o Figueiredo ia querer saber os seus segredos?
— Também tens razão. E trouxeste algum pastelinho de nata? Dieta líquida, dieta líquida e fica para aqui um homem cheio de fome.

22/11/10

Keept it simples: da relatividade de Einstein ao valor do dinheiro

Aqui há uns anos lia-se muito Piaget. Eu, pelo menos, lia. De um dos seus livros, ou de algum livro sobre ele, recordo uma história em que se contava que as crianças não tinham qualquer dificuldade em compreender a relação entre tempo e velocidade proposta por Einstein.
Até uma determinada idade, os putos achavam absolutamente natural — e mesmo uma evidência sem necessidade de demonstração — que quando se anda mais depressa o tempo passa mais devagar.
A mesma clarividência parece desenhar-se a propósito de finanças.
Tentem explicar a um miúdo as guerras cambiais entre a China e os EUA com a Europa pelo meio. Façam-no recorrendo a exemplos domésticos e deixem os esoterismos de lado.
A resposta, verão, será invariavelmente a mesma: Tens falta de dinheiro? Bom, mas nesse porque é que o governo não fabrica mais notas e pronto?, dirá ele, borrifando-se completamente para as valorizações e desvalorizações da moeda.
Ou seja, as crianças não só percebem com facilidade Einstein como, ao que parece, também concordam com Occam: entia non sunt multiplicanda praeter necessitatem. E tudo isto sem saberem nada de física, de latim, ou de finanças. Abençoadas!

21/11/10

Será que a malta ficou surda de tanto português técnico?

Que mania será esta de trocar sistematicamente porque por por que, escrever acerca de em vez de sobre, a fim de em vez de para, cindir em vez de separar, abordagem em vez de aproximação, interrogação em vez de pergunta, alega em vez de defende, sendo que em vez de e, inclinamo-nos a supor em vez de supomos, concebida como consistindo em vez de consistir….?!

19/11/10

"Tarjas e T-shirts" apreendidas na fronteira portuguesa: e o cão do Obama, pôde entrar?

Não sei se vieram da Finlândia mas eram finlandeses. O seu objectivo era manifestar-se em Lisboa durante a cimeira da NATO. Traziam "tarjas e T-shirts".
As "tarjas e T-shirts" ficaram apreendidas. Os finlandeses ficaram em Espanha.
A não ser que alguém me explique desde quando o direito de manifestação foi suspenso na Europa, e a não ser que alguém me explique como é que se produzem explosivos ou armas de arremesso a partir de tarjas e T-shirts, fico na minha: vão para o caralho, que agora até já se pode dizer!*
*João, custou mas lá saiu.

Cavaco terá medo que o espião de Sócrates vá substituir Jorge Silva Carvalho na direcção do SIED mas os tipos do Câmara Coperativa não confirmam

O anúncio da demissão de Jorge Silva Carvalho do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa nas vésperas da cimeira da NATO caiu — salvo seja — como uma bomba.
Augusto Santos Silva já veio afirmar que isso não afectará em nada a segurança dos participantes nem a imagem de Portugal lá fora, mas esta última certeza foi, entretanto, contrariada por vários telefonemas feitos a partir do estrangeiro, alguns dos quais chegaram a pôr em causa a virilidade do ministro.
Conhecido internacionalmente por “gostar de malhar”, houve quem não entendesse a sua paralisia face à decisão do chefe máximo dos espiões.
After all, ele gosta de malhar, garantiu simpaticamente um assessor de Obama de ascendência açoriana. Mas em quem?!, retorquiu céptico o treinador de Bo que passava nesse momento pela Sala Oval. O tamanho de Jorge Silva Carvalho teria contribuído para o retraimento do ministro, comentava-se em segredo pelos corredores do Eliseu com receio de melindrar Sarkozy. Na Alemanha, os serviços secretos aventavam a hipótese de "malhar" significar “fazer malha”. Esta suposição terá sido a que mais magoou Santos Silva que logo mandou dizer a Angela que, embora nada tivesse contra hobbies femininos, nunca na vida havia feito tricot.
Enquanto isto, no Palácio de Belém, Maria Cavaco Silva avisou o marido, logo ao pequeno-almoço, que se Rui Paulo Figueiredo fosse nomeado para o cargo deixado vago por Silva Carvalho, e ele não reagisse, levava com um processo de divórcio.
Aturei-o sempre coladinho a ti lá na Madeira, mas isso foi só para não dar o braço a torcer ao Alberto que passou o tempo a fazer piadas!, rematou a primeira-dama entre torradas, lágrimas e suspiros.
Tentámos obter a confirmação destas notícias junto da fonte sempre bem informada do Câmara Coperativa mas a pessoa que nos atendeu — recusando identificar-se e assegurando apenas que não era o Abrantes quem falava — jurou que não sabia de nada e que andavam agora demasiado ocupados a malhar na direita porque defender o Sócrates também já parecia mal.
O blogue mudou muito nas últimas semanas, foi a única declaração que lhe conseguimos arrancar.

18/11/10

Yo no creo en classes, pero que las hay, las hay


Em caso de necessidade, os hospitais civis de Lisboa estão preparados para a Cimeira da Nato.

O Santa Maria recebe presidentes, primeiros-ministros e ministros...
O São Francisco Xavier recebe outros participantes avulsos...
Agora adivinhem para onde mandam os manifestantes? Ora bem. Vão para o São José e vão com sorte!
Lido AQUI.

17/11/10

Vão desculpar-me a linguagem de caserna mas custa-me a crer que um clube de gajas nuas fomente a leitura de Faulkner ou sequer do Henry Miller

Cada um lê como muito bem lhe apetece. Uns gostam de ler na cama, antes ou depois de dormir ou de outra coisa qualquer. Há quem teime nos cafés, apesar do sumiço dos mesmos. Há quem prefira jardins e há quem eleja a sanita. Há leitores que só na biblioteca e outros que só em trânsito. Há quem leia enquanto come. Há quem não dispense o barulho e há quem exija silêncio.
O meu leitor preferido é Eliot: I read, much of the night, and go south in the winter.
Isto era tudo o que eu sabia sobre o assunto antes de ter tropeçado no Naked Girls Book Club, um clube semiprivadoe exclusivamente feminino em que a condição para se ser sócio é gostar de ler despido(a). E quem julgue que a coisa se fica pela leitura d’ O amante de Lady Chatterley ou similares mais apimentados, esclareço já que quando se clica no rectângulo à direita que diz “books reviews” vamos parar imediatamente a Faulkner e ainda por cima a Absalom, Absalom.
Impressionados? Eu fiquei, embora confesse que só me veja a ler Tolstói muito vestida, de preferência de xaile, lareira acesa e uma caixa de madeleines para acompanhar o cognac.
O que me leva da Karénina a Marilyn. Dizia Wilder: My aunt Minnie would always be punctual and never hold up production, but who would pay to see my aunt Minnie?
Citado o meu guru, se é verdade que as meninas do Book Club serão um pouco mais atraentes do que a tia Minnie do Wilder, I presume, ainda assim a Marilyn mete-as a todas num chinelo. Despida ou vestida. E se ela lia e mesmo que não lesse!

16/11/10

A minha tia raquel e os estados de alma do ministro

A minha tia Raquel tinha achaques. No tempo quente não saía de casa, no tempo frio também não. Nas estações intermédias, que as havia, melhorava. Ainda assim, pelo menos uma vez por semana era certo e sabido que a iríamos encontrar, ora suspirando melancolicamente pelos cantos, ora guinchando esdruxulamente com a vizinhança. Os estados de alma da minha tia era incompreensíveis.
Podia agora continuar a falar-vos da minha tia Raquel, mas como ela própria me diria "não maces as pessoas e vem para dentro".
Já o Amado é outro assunto. Disse o próprio, a propósito das suas declarações ao Expresso este fim-de-semana, que aquelas não passaram de "desabafos sobre estados de alma".
Confesso que não li a entrevista. Contaram-me que a dada altura Amado apelava a um governo de salvação nacional ou coisa parecida. Vou deixar de lado o que eu acho sobre isto não ter salvação possível que ninguém me perguntou. Mas "os estados de alma" ficaram-me atravessados.
Então aqui há uns tempos, após recusar-se a votar num pirómano de livros para director da Unesco, Carrilho não foi acusado precisamente do mesmo, acabando, aliás, et pour cause!, por ser corrido do cargo? (Com o hiato temporal diplomaticamente adequado...)
Ou seja, quer dizer, um simples diplomata não pode ter um achaque em privado mas já o ministro pode desabafar em público e não lhe acontece nada?! Nem sequer o convidam para o lugar do Sócrates?
[também publicado aqui]

A book a day keeps a doctor away: "Jan Karski", Yannick Haenel

Jan Karski (1914-2000), pseudónimo de Jan Kozielewski e livro homónimo de Yannick Haenel, foi um resistente polaco católico, testemunha do Holocausto junto dos governos inglês e americano, após visitar clandestinamente o gueto de Varsóvia e um campo de concentração onde conseguiu penetrar disfarçado de guarda ucraniano.
O livro de Yannick Haenel está dividido em três partes. A primeira retoma o filme/documentário de Claude Lanzmann sobre o extermínio dos judeus na Europa, Shoah, e as declarações nele feitas por Jan Karski. A segunda coteja Story of a Secret State, escrito pelo próprio Karski e editado em 1944 nos EUA. A terceira resulta tão-só da imaginação de Haenel e descreve-nos um homem envelhecido e deprimido, em luta com a memória.
A obra foi publicada em França o ano passado, ganhou o Interallié (prémio criado por um grupo de jornalistas — homens — que aguardavam entediados num restaurante o resultado do Femina) e viu-se enredada em acesa polémica. Em causa, grosso modo, os limites da ficção e as relações entre história e literatura.
Lanzmann, polemista à moda antiga, saiu a terreiro e acusou Haenel de plágio, de mediocridade literária e falta de perspectiva histórica. O escritor respondeu dizendo que o pretenso plágio era, na verdade, prova da sua admiração pelo trabalho do realizador, que este tinha uma visão “positivista” das relações entre ficção e história e que a investigação que levara a cabo alicerçava suficientemente o seu retrato do polaco. A discussão poderá parecer demasiado francesa mas levanta questões importantes.
Lido Jan Karski, três aspectos a registar. 1: a imagem de alguém obcecado pela “questão judaica”; 2: a imagem de uma Polónia abandonada por todos e injustamente acusada de anti-semitismo; 3: a ideia que os judeus podiam ter sido salvos, e só não o foram devido à total indiferença dos Aliados.
Esta última tese — porque de uma tese se trata — é o cimento com o qual Haenel constrói o livro.
Pondo por ora de lado a questão da qualidade literária, alguns senãos se levantam.
Se é um facto que Karski ficou para a história como o católico que, tendo observado ao vivo a “Solução Final”, tudo fez para a denunciar junto dos Aliados (dando literalmente voz ao apelo desesperado que lhe havia sido transmitido pelos judeus de Varsóvia), não é menos certo que ele é, acima de tudo, uma testemunha do colapso do seu próprio país, no qual as forças nazis arrasaram as elites e escravizaram brutalmente as populações.
Em segundo lugar, se, enquanto membro da resistência polaca, Karski só pode atestar a luta contra o ocupante naquele que era, então, território repartido entre a Alemanha e a URSS, não é menos verdade que o anti-semitismo polaco tem uma longa tradição, tendo-se mesmo registado vários pogroms a seguir ao final da guerra, de que o mais tristemente célebre foi o de Kielce, a 4 de Julho de 1946, durante o qual foram mortos cerca de 40 judeus.
E é sobre o último ponto — a salvação dos judeus — que a polémica mais se assanha. Lanzmann, como muitos, defende que, uma vez a guerra iniciada, tal se tornara impossível. Haenel advoga em sua defesa declarações do próprio Karski, em que este diz que os governos aliados haviam abandonado os judeus à sua sorte. Infere-se daí que os Aliados foram cúmplices?
O livro de Yannick Haenel quer-nos fazer crer que sim. Assim sendo, porém, torna-se incompreensível que o escritor venha içar a bandeira do “direito à ficção” em resposta aos críticos, já que o seu tema não é ficcional, é político. Nisto, aliás, reside a sua maior fragilidade, descontada a opção fácil da divisão em três partes.
Não é, pois, por abordar o tema do Holocausto (que seria tabu) de forma supostamente herética que Jan Karski falha (aliás, o Holocausto nunca foi tema tabu, apenas tema difícil: como pode a ficção falar do que a ultrapassa?). Falha porque ao querer encaixar a todo o custo a figura do resistente polaco na sua visão da “Solução Final” como fruto de uma cumplicidade tácita entre Hitler, Roosevelt e Churchill, Haenel cai na armadilha ideológica.
Não será por acaso, pois, que a primeira parte da obra, expurgada desse peso, e dando voz ao próprio Karski (via Lanzmann), seja a mais conseguida. Eis-nos, por momentos, face a um homem que suporta os seus abismos sem rede. A grande arte é disso que trata. O resto não é literatura.
Jan Karski, Yannick Haenel, Teorema, 2010, trad. de Carlos Correia Monteiro de Oliveira, 164 páginas

15/11/10

Parem lá de me lançar dardos [que eu gosto]

Muito obrigada ao Ruy Obscuro, apesar daquela tacada nos meus bolos, e ao MCS pelo elogio na pontaria dos mesmos. Sai um alqueire de bolas de berlim para cada um!

13/11/10

Ser de esquerda é estar um homem nas urgências do hospital e lembrar-se que foi dali que fugiu o Henrique Galvão

Ele: Não fomos para o São José, pois não?
Ela: Não, estamos no Santa Maria. Já lhe tinha dito.
Ele: Pois, de repente não me lembrava. Santa Maria, dizes?
Ela: Sim, Santa Maria.
Ele: Foi daqui que fugiu o Henrique Galvão.
Ela: Daqui?
Ele: Sim, daqui. Estava preso quando fugiu…
Ela: Preso no Hospital?
Ele: Preso. O Salazar tinha-lhe um pó que se não tivesse fugido ainda hoje estaria dentro (risos).
Ela: Mas fugiu daqui?
Ele: Daqui, não. Do primeiro andar. Estamos no rés-do-chão, não estamos?
Ela: Sim, acho que sim.
Ele: O Galvão fugiu lá de cima. Enfiou uma bata branca e ala que se faz tarde. Saiu pela porta principal. Boa-tarde, senhor doutor, boa-tarde, senhor doutor. E o Galvão, boa-tarde, boa-tarde…
Ela: Estão a chamar pelo seu nome.
Ele: Vamos lá então… Eles aqui são rápidos.

12/11/10

Como sou uma mulher livre atiro dardos a quem bem me apetece

O João Lisboa foi mesmo um querido e lançou-me um dardo. Atingida gloriosamente pelo artefacto, cabe-me agora passá-lo a outros. Depois de muito meditar, cheguei às vítimas que se seguem (indiferente, esclareço já, à teorização sobre os valores subjacentes ao prémio, embora tenda a concordar com o Maradona mas só nas partes em que concordo e não nas outras).
A ordem seguinte é arbitrária e talvez mesmo discricionária (gosto destas frases que rimam à maneira do GRANDE Cabrera Infante que nunca foi Prémio Nobel).

Luís Januário : Porque me comove e possui a capacidade rara de tornar as ideias sensíveis
Morgada de V : Porque pensa e escreve maravilhosamente e tem um humor de (me) fazer inveja
Menina Limão : Porque confessa coisas inconfessáveis sem ir ao confessionário
Bruno Vieira Amaral : Porque se farta de ler e ainda por cima bem
Coisa Ruim : Porque gosto mesmo do que a coisa ruim alinhava (quando se dispõe a isso)
Delito de Opinião : Porque são simpáticos, civilizados e para grunhos já basta assim
JM Correia Pinto : Porque quando o visito aprendo coisas (ou, pelo menos, eu acho)
João Gonçalves : Porque apesar das muitas divergências e do mau gosto de apoiar Cavaco Silva, aprecio pessoas com mau feitio não selectivo
Imprensa Falsa : Porque estou farta das notícias oficiais
Jorge Fallorca : Porque sim e mais não digo…
Agora amanhem-se.

Um país que aceita submergir a Linha do Tua merece afundar-se e desaparecer do mapa

Canavilhas, Gonçalo Couceiro, Mexia e etc.: em bom português, fuck you!
[imagem retirada daqui]

10/11/10

Enquanto o FMI, já perto da fronteira da Galiza, tenta perceber o método português de pagamento das SCUTS, Teixeira dos Santos continua a fazer força

Surpreendido pelos jornalistas à saída do seu encontro semanal com o Professor Karamba, o Ministro das Finanças reafirmou que só com muita, muita concentração Portugal conseguirá afastar as forças maléficas do FMI. Adiantando que o Professor Karamba ficara no interior do edifício a concentrar-se com toda a força mais um bocadinho, e recusando-se a mais declarações, Teixeira dos Santos entrou no carro rematando com ar compungido: May the force be with you.
Os jornalistas, também eles comovidos, desmobilizaram.
[também publicado aqui]

Quem devia ter chamado o FMI era eu

SEVEN. The magnificent seven. The last frontier. Quem o disse foi o Teixeira dos Santos: depois do 7, o déluge.
Pois bem. Eu paguei muito mais do que isso. E passo a explicar.
Por motivos idiossincráticos que se prendem com uma péssima relação com a autoridade e com a arrumação de papéis, vi-me não há muito confrontada com uma dívida choruda ao fisco. Para resumir a coisa: eu teria a receber uma pipa de massa mas no fim quem pagou a conta? Quem? Adivinharam.
Perante o facto de me ser impossível continuar a viver cabelo ao vento sem documento, fui às Finanças tentar negociar com o Estado.
Eis o que me disse o Estado.
— A senhora tem várias hipóteses. A) Vai para casa, esquece que falou comigo e vai pagando como pode; B) Propõe um pagamento faseado; C) Pede um empréstimo bancário e paga tudo.
A primeira hipótese é simplesmente retórica. Porquê? Porque as Finanças lhe vão fazer a vida num inferno. Seja a sua dívida 20 cêntimos ou 10 mil euros, para o computador é igual. A partir do momento em que a classificou como devedora ao fisco, nunca mais a larga. E vai esmifrá-la em roda livre. Francamente, não lhe aconselho.
A segunda hipótese implica que nos traga algo para a troca. Uma casa, um carro, uma garantia bancária… Conversamos e chegamos a um valor mensal. Sinto-me obrigado a avisá-la, contudo, do seguinte: os juros são a 12%.
O que nos conduz à terceira hipótese. Vai ao banco, tenta o empréstimo e liquida tudo de uma vez. Os juros nunca serão tão altos.
E foi assim que o Estado negociou comigo. Com um acrescento. Como o funcionário era simpático, adiantou-me uma quarta hipótese off the record.
— Emigre, vá-se embora daqui e não pague nada!
Os mercados e blábláblá são uns bandidos, diz o Teixeira dos Santos? Pois. E ele é o quê? Um darling, queres ver?
[também publicado aqui]

09/11/10

A merda das elites e porque o homem sempre me provocou urticária o Sócrates como arquétipo dos políticos farinha amparo [e estou a ser delicada]

Numa entrevista ao João Lisboa, o Caetano usou a expressão. “Merda das elites”. Pois merda das elites é o que para aí mais há. Tanta, tanta merda, que um dia destes mesmo com baixa mar vamos ficar atolados.
Vou dar um exemplo. Há umas semanas fui ouvir o Eduardo Lourenço. O senhor já passou a barreira dos 80 e era o melhor da sala. Humana e intelectualmente, nenhum dos presentes lhe chegava sequer aos calcanhares. Não acham assustador? Pois eu acho. E tanto mais assustador quanto o resultado deste vazio de ideias é a multiplicação de pinhos, linos e socretinos que nos rodeiam por todos os lados (à esquerda, à direita e ao centro).
Eu sou do tempo (e não sou assim tão antiga...) em que uma pessoa ouvia um político e, descontada a demagogia inerente à actividade, podia-se concordar ou discordar. Podia-se até ter vontade de o esganar. Hoje? Hoje perdeu-se o mínimo denominador comum. Como discutir com cavalgaduras que acreditam em painéis solares que funcionam com sol, céu nublado, chuva e até noite cerrada?!
O caso do Sócrates é, neste sentido, paradigmático. O homem não tem uma Ideia. Na realidade, nem sequer uma sombra de uma Ideia. Limita-se a adoptar a última novidade, trocando as casas de pato-bravo pelo kitsch envidraçado, os fatos da Maconde pela corte à House of Bijan.
O fitness é o que está a dar? Tirem-se muitas fotografias em calções para emoldurar nos jornais.
As alternativas é o que está a dar? Encha-se o país de moinhos de vento e o consumidor que pague a factura.
A informática é o que está a dar? Distribuam-se Magalhães e dividendos pela JP Sá Couto e o desenvolvimento do raciocínio das criancinhas que se dane.
A causa gay é o que está a dar? Entretenha-se o pagode com o casamento homossexual enquanto o Vara recebe robalos.
O digital é o que está a dar? Invente-se um Simplex e mantenham-se as moscas.
A China é o que está a dar? Lamba-se o cu aos chineses e que se lixe a hipoteca mais os direitos humanos.
Pragmático? Não, um imbecil robótico. E dada a velocidade da sua reprodução das ervas talvez o futuro lhe pertença. Em versão Xerox.
Fake por fake Que Viva Las Vegas!

07/11/10

A reabertura dos restaurantes chineses fechados pela ASAE na agenda de Hu Jintao

Fontes bem informadas garantiram-me que foi por pouco que a visita do presidente chinês a Portugal não azedou logo no primeiro dia.

Na ementa do banquete do Palácio da Ajuda constava, por cortesia, uma sopa tipicamente chinesa.
A dada altura, Cavaco Silva, que é muito esquisito com a comida, disse em voz baixa para a Maria que a sopa de ninho de andorinhas lhe sabia ligeiramente a merda.
Um chinês ouviu, não gostou, e estava já a dívida pública a ir pelo cano quando o aparecimento providencial de Luís Amado conseguiu apaziguar os ânimos.
Amado, após explicar ao presidente português, e esposa, que aquele era o sabor normal da sopa (bastando para isso pensar nos seus ingredientes e blábláblá...), prometeu interceder diplomaticamente junto da ASAE para que todos os restaurantes chineses fechados nos últimos anos voltassem a abrir as portas, incluindo os que, entretanto, se tinham convertido ao sushi take away que ficariam com direito de opção.
O incidente ficou por aí mas, já no final da noite, houve quem ouvisse Cavaco insistir com a Maria: Estou-te a dizer que a sopa sabia a merda...

06/11/10

Pedro Correia, lamento, mas a frase do ano é minha que a ouvi com estas que a terra há-de comer

Pois é, Pedro. O autor da frase é anónimo mas ainda assim merece o prémio. Falava-se de dívida soberana, mercados, juros, especuladores e chineses. Foi quando ele suspirou e disse: Só a mim é que ninguém me compra as dívidas!

05/11/10

Foi preciso vir um homem de 74 anos que já devia ter direito a sopas e descanso para alguém no PS chamar o boi pelos nomes: Sócrates é um aldrabão

Henrique Neto arrasa-o: vendedor de automóveis, ignorante e mentiroso.
Eu, que não sou militante do PS, não tenho 74 anos mas já tirava umas feriazinhas, subscrevo e aplaudo.

Cheira-me a esturro e é precisamente por causa das bombas

Juro que não fui raptada em pequenina por extraterrestres e com esta declaração quero assegurar aos clientes da Pastelaria que não sou adepta de teorias conspirativas.
Dito isto, serei a única a achar estranho que, das incontáveis bombas que têm sido descobertas nos últimos dias, nem uma só tenha explodido?
Assim por alto, parece que a Grécia já leva cerca de 15, a que se vieram somar depois as do Iémen.
Perante tanta eficácia antiterrorista, cá para mim das duas uma: ou os bombistas passaram todos a tirar o curso de bombistas ao domingo ou há qualquer coisa aqui parecida com a gripe A.

04/11/10

Amigos para sempre — ou o jardim da Celeste visto por Manuel António Pina

Eu também viabilizo o Orçamento porque ele é, como a dra. Ferreira Leite diz (e quem não salta não é da malta), um testamento, perdão, um "tratamento inevitável".
Concordo com a redução dos salários dos funcionários públicos (até porque não sou funcionário público), com o fim ou diminuição das prestações sociais, sobretudo as que atingem os desempregados e os mais pobres (também não sou desempregado nem pobre), com o aumento do IVA, do IRS e do IRC (desde que isso não afecte os bancos nem a Mota Engil), com o fim das deduções fiscais, e com todas as mais medidas recessivas, pois isso agrada aos "mercados" e fará o milagre da multiplicação do capital e do investimento estrangeiro, já que o capital e o investimento estrangeiro gostam de pobres e mal pagos e nós ainda não somos suficientemente pobres nem suficientemente mal pagos.
E se os "mercados" estiverem a ouvir que saibam que, como quer a dra. Ferreira Leite, "somos todos amigos" de peito, desempregados, pobres, idosos com pensões congeladas, crianças sem leite e sem Abono de Família, o eng.º Sócrates, o dr. Teixeira dos Santos, a própria dra. Ferreira Leite e os 4 Cavaleiros do Apocalipse, os drs. & engºs. Salgado, Faria de Oliveira, Ferreira e Ulrich, e muitos mais, "tantos que nunca pensei que a morte tivesse levado tantos". Ouçam, "mercados", somos nós, de mãos dadas, a cantar: "Fui ao Jardim da Celeste, giroflé, flé, flá".
AQUI

03/11/10

Gente fina é outra coisa mas eu ainda assim prefiro a fórmula antiga: V. Ex.ª vai-me desculpar mas V.Ex.ª é um filho da puta

Pouco passava do acordo e, na Assembleia da República, estalava o verniz do bloco central.
Diz Luís Menezes, do PSD, referindo-se a coisas como a ANACOM, da Estradas de Portugal, a Administração da Região Hidrográfica do Norte ou a Associação de Turismo dos Açores: Estas instituições, muitas delas desconhecidas dos portugueses, e a maioria inúteis, estão enxameadas de boys socialistas, que as têm usado como um verdadeiro bar aberto de despesas supérfluas e desnecessárias.
Responde o Teixeira dos Santos, do PS, que não é ministro de se ficar: Falando em boys, o jantar da ANACOM foi, de facto, promovido por uma girl nomeada pelo primeiro-ministro Santana Lopes.

E tudo isto à hora do chá e com senhoras na sala.

02/11/10

Depois dos painéis solares faça chuva ou faça sol e mesmo à noite, Sócrates tira novo coelho da cartola: as mini-hídricas, senhores, as mini-hídricas!

Sócrates continua a surpreender-nos. Quando interrogado hoje no Parlamento sobre onde iria buscar os 500 milhões de euros que faltam no orçamento, o primeiro-ministro não falou de Chávez nem do Magalhães nem sequer dos portos de que tanto gosta. Falou de... mini-hídricas.
Para o ano, disse o engenheiro, com as mini-hídricas a funcionar gota a gota vai ser um vez que te avias. Nem a Alemanha nos agarra. Olaré.
[Sobre painéis solares que funcionam com sol, céu nublado, chuva e à noite ver AQUI. E desculpem-me insistir na coisa]
Imagem retirada daqui.

01/11/10

Mais uma ideia saída da cabeça dos iluminados que nos governam: agora vão ensinar finanças às criancinhas

Há coisas que já nem dá para rir. Diz uma senhora chamada Susana Albuquerque, secretária-geral de uma Associação de Instituições de Crédito Especializado, que a sua digníssima associação e o digníssimo ministério da educação estão prestes a concluir um acordo para introduzir a "educação financeira"... no ensino básico, logo a partir do 1º ciclo que de pequenino é que se torce o pepino, acrescento eu.
E está uma pessoa a fazer um esforço hérculo para manter o que lhe resta da sua sanidade mental e leva com estas bestas por volta das 4 da tarde, mais coisa menos coisa, logo no dia dos mortos.
Isto continua assim e nem com comprimidos lá vai.

Sanidade: estamos todos precisados


Rally to Restore Sanity