29/05/09

O socratismo ou a doença infantil do cavaquismo [talvez seja ao contrário]

QUANDO ALGUÉM EXPLICA COM TANTA CLAREZA O QUE EU ANDAVA CÁ A MATUTAR...

O dr. Cavaco, verdadeiramente, nunca foi bem um político ou estadista convincente e providencial. Um chefe que inspirasse confiança. Um espírito à altura do seu papel. Para tal era preciso carácter, integridade, autoridade pessoal, lucidez, vigor, cultura. Não era necessário ser intelectualmente grande, bastava prudência e sinceridade pela "coisa" pública. No invés, o dr. Cavaco apenas quis sobreviver para a sua viagem pessoal, mesmo quanto sugeria estar a tutelar os desígnios pátrios. Sorte grande a sua, desilusão a de todos nós. As vagas teorias sobre a Democracia, Portugal ou a Europa desse filho pródigo de alguma direita saudosa (o novo Messias) morreram logo na razão dos curiosos desmandos que a sua governação divulgou. A felicidade pública do nativo, artificialmente excitada, expirou mesmo antes de se avistar a "aritmética economista" do seu vindouro "oásis". Como diria Ramalho Ortigão: "os deuses eram de palha". O dr. Cavaco não nos salvou da ruína, da decadência, não modificou o regime ou o sistema político, não soube construiu uma Res Publica, uma democracia. Apenas se rodeou no poder (sem que qualquer indignação se lhe visse) de um sem número de "adesivos" ou curiosos "senadores" que, mesmo aparentemente servis, astutamente o utilizaram para despojarem o orçamento do Estado. Os seus "procuradores do povo" arrumaram, antes de tudo, a sua própria clientela e souberam bem representar os seus interesses pessoais. O dr. Cavaco, no meio do seu azedume contra a canalha, só conduziu o país para a confusão e abuso de uma "rede clientelar" de consequências absolutamente desastrosas. A política pós-Cavaco passou a ser uma "questão de compadres", de intrigas e as "avenidas do futuro" construídas, herança da sua obra financeira, foram um inegável "brinde" aos novos caudilhos. A trágica destruição das instituições, o desamparo à sociedade civil, o cansaço e a desmoralização a que hoje assistimos (e a que estamos condenados) venceram-nos definitivamente. Não por acaso estes dias irae da desvairada governação do regedor Sócrates são consequência funesta disso tudo. A lista dos Dias Loureiros, Oliveira e Costa, os prebentados de Macau, os melífluos Constâncios, o Lopes da Mota e os Freeport intermináveis que lentamente surgem, não têm fim à vista. A degeneração é total. Não há que estranhar! (...)

Naturalmente, daqui.

28/05/09

Maniqueísmo update: Vital passou do "sempre, sempre ao lado do povo" para o "sempre, sempre ao lado do polícia"

Quando se trata de prevaricações, prefiro caçar o prevaricador e não atirar sobre o polícia, disse Vital Moreira no âmbito da campanha para o Parlamento Europeu, referindo-se ao caso BPN e, supõe-se, a Vítor Constâncio.
E, por falar em campanha para o Parlamento Europeu, fiquei hoje a saber [se calhar já toda a gente sabia...], ao tropeçar num cartaz de rua da Juventude Socialista, que a JS é pelo "direito ao TGV" [!!!]. Acabo de encontrar a justificação online:
Quanto ao TGV, esta é uma proposta que a JS defende activamente sem qualquer lugar para dúvidas. É um direito da juventude, porque seremos nós quem mais tirará proveito com a alta velocidade.
Li e fiquei de rastos (e não, não são as preposições que me matam...)!
É que uma pessoa põe-se a pensar no InterRail com paragem em todas as estações e apeadeiros e (descontado o pivete das peúgas e a falta de desodorizante dos compagnons de route) não só leva com "o tempo, esse grande escultor" como ainda leva com o jovem Duarte Cordeiro.

26/05/09

Cruzamento de dados: o paraíso sexual de João César das Neves e o deboche da igreja irlandesa

Não sei porquê, durante muito tempo pensei que João César das Neves, colunista do DN, fosse padre. Afinal é economista, professor universitário e ex-assessor de Cavaco Silva. Estamos sempre a aprender.
Padre ou não padre, César das Neves é ferveroso defensor da Igreja católica apostólica romana. Tem todo o direito a sê-lo. Nessas coisas da intimidade de cada um não me meto. Agora o que não acho bem é que, sem me conhecer de lado algum, o Neves se ponha com insinuações acerca da minha pessoa.


Esquerdistas é comigo, claro. Não que eu seja canhota. Ou cega. Ou surda. Para resumir: sou de esquerda e tenho dúvidas.
Por exemplo, tenho dúvidas sobre a utilidade ― e exequibilidade ― de uma disciplina de "Educação Sexual" autónoma. Tenho dúvidas que isso seja uma disciplina, à semelhança da Geografia [que saudades da geografia!], da Matemática, da Física ou das Línguas.
Posto isto: que César das Neves, padre ou não padre, venha falar dos good old times em que prevaleciam "o pudor, a castidade e matrimónio", opondo-os aos actuais, em que prevalecem a "masturbação" o "impulso sexual" e a "perfeita equivalência entre todas as opções sexuais", já me parece excessivo ― mesmo para uma esquerdista ambidextra.
Sejamos claros: não é preciso ter lido o Velho Testamento para saber que a rebaldaria vem de longe. Pormenores teológicos à parte, fiquemo-nos pelo recente relatório irlandês sobre os abusos sexuais praticados pela Igreja católica durante 60 anos na maior das impunidades. Aos padres e freiras metidos ao barulho, teria César das Neves de lhes chamar "porcalhões", "debochados", "proxenetas" e etc. Mas o problema, caro professor, é que os abusos eram endémicos. E tudo isto antes da "deseducação sexual"! Há coisas do diabo!
Texto de João César das Neves descoberto aqui.

25/05/09

Um crente muito especial [João Bénard da Costa – 1935/2009]

De novo Jean-Luc Godard reaparece nas minhas histórias.
Já amava – tanto e tanto – Nicholas Ray. Já tinha visto muitas vezes Johnny Guitar. Mas ainda não tinha visto Bitter Victory, com estreia mundial no Festival de Veneza de 1957, em Setembro, mas só apresentado em Portugal em Maio de 1958, no Éden, quando me veio parar às mãos o número 79 (Janeiro de 1958) dos Cahiers du Cinéma. Nesse número, saiu, por baixo de uma fotografia de Richard Burton (grande plano da cara, com o deserto em fundo e um par de botas ao lado), o texto que se chamou Au-delà des étoiles, «crítica» a Bitter Victory de Nicholas Ray, filme que, na mesma edição, Godard considerou o melhor de 1957.

Era esse texto, era, o que começava assim:
«Havia o teatro (Griffith), a poesia (Murnau), a pintura (Rosselini), a dança (Eisenstein), a música (Renoir). Agora, há o cinema. E o cinema é Nicholas Ray.»
Lembro-me que li esses versos – talvez os que mais citei e recitei em vida minha – no dia em que fiz 23 anos. Tive de aguentar quase quatro meses até os poder confrontar com o modelo e até poder repetir, em conhecimento de causa, «não é cinema, é melhor do que o cinema». Depois – nestes quase quarenta anos decorridos – quantas vezes revi eu Bitter Victory, quantas vezes escrevi sobre ele? Não sei. Mas sei seguramente que é o filme de Nick Ray que melhor conheço (depois de Johnny Guitar), que é o filme de Nick Ray em que mais reflecti e sobre que mais escrevi (mais do que Johnny Guitar), e que é o filme de Nick Ray a que, subjectiva e subterraneamente, mais coisas me ligam.
Dele, apetecia-me poder dizer o que Truffaut disse de Johnny Guitar. «Este filme teve mais importância na minha vida do que na vida de Nicholas Ray.»
Mas sei demais para o poder dizer de coração ao pé da boca. Bitter Victory, primeiro filme de Ray longe de Hollywood (co-produção franco-alemã, rodada na Líbia com um fortíssimo investimento da Columbia), foi o filme com que Ray sonhou voltar a casa triunfante, para que não mais se repetissem azares como os que havia conhecido na sua obra precedente (The True Story of Jesse James). Em vez disso, só conheceu raivas e desesperos. Apesar dos ditirambos dos Cahiers, Bitter Victory foi um flop e o que se passou durante a rodagem contribuiu, mais do que todo o passado, para lhe arruinar uma reputação que, na América, já não era famosa. Gavin Lambert, um dos argumentistas, contou que, quando o reencontrou em Paris, no fim das filmagens, Ray vinha destruído. «Destroçado, traumatizado. Visivelmente, tudo tinha sido horrível. Estava num momento crucial da vida e o desastre acontecera. Os problemas com o álcool... Foi também quando começou a drogar-se muito. Se o filme tivesse corrido bem, toda a vida dele teria sido diferente.» Recordo que Nicholas Ray filmou Bitter Victory aos 45 anos.
Mas foi Truffaut quem falou, a propósito de Nick Ray, dos «grandes filmes doentes». Essa marca da doença, como a da crise, a do malogro, são o cerne da grandeza da obra do homem que, neste mesmo filme, pôs na boca de Richard Burton o verso de Walt Whitman: «I always contradict myself.» E eu julgo que Bernard Eisenschitz viu bem quando, na monumental obra sobre Nick Ray Romain Américain: Les Vies de Nicholas Ray (publicado em 1990, onze anos depois da morte do realizador), escreveu que o que levou a esses extremos de subjectividade sobre ele foi exactamente o ponto extremo de subjectividade em que ele próprio se colocou. Por um lado, no cinema mais moderno, o retorno ao que havia de fundamental no estilo clássico: a autonomia interna do plano e o choque da sucessão deles, para, desta vez, citar Straub. Por outro, o que podia ser «mais do que cinema», ou seja, a relação que ele sempre viu entre este e o inconsciente e que o levou a dar à improvisação – no melhor e no pior – lugar enorme. «Em Hollywood, dizem-nos que tudo está no script. Mas se tudo está no script, porquê e para quê fazer o filme?» «Com Bitter Victory, começa a formular-se a aproximação ao cinema como meio de expressão total. Não sendo Eisenstein e ignorando tudo dos eruditos processos especulativos deste, Nick Ray só o pôde fazer arriscando tudo o que sabia, cedendo em certas passagens para avançar noutras, perdendo o controle. Bigger Than Life, o filme que teria podido ser Jesse James, Bitter Victory, Everglades são filmes de derrapagem, tanto na medida em que são filmes sobre personagens em derrapagem – paranóia, desejo de morte, histeria – como porque a construção deles segue esse mesmo movimento.» (Eisenschitz).

Volto a mim e ao filme, para explicar melhor. Em 1958, eu vi Bitter Victory inteiramente do lado do Capitão Leith (Richard Burton), o mais novo dos dois protagonistas masculinos. Arqueólogo inglês, vivera, muito antes da acção do filme, uma história de amor com Jane (Ruth Roman), que conheceu numa visita ao British Museum, numa tarde em que falaram de estátuas egípcias e assírias. A 25 de Agosto de 1939, no mesmo British Museum, essa história rompeu-se. Foi ele quem a rompeu, incapaz do salto no desconhecido que a paixão necessariamente implica. Teve medo e fugiu.
Reencontraram-se três anos mais tarde, em Bengazi. Jimmy Leith era, agora, capitão do exército inglês e tinham-lhe confiado perigisíssima missão, sob as ordens do major Brand (Curd Jurgens). Na mesma noite, num night-club da cidade, descobre que Jane casou com o major e é agora Mrs. Brand. Quando ficam sós, Leith, como Johnny Guitar, exprime ciúmes tardios e injustos. «Todos temos a memória curta, não temos?» «A guerra é tão dura como o amor.» Mas cala-se quando Jane lhe pergunta: «Jimmy, porque é que não ficaste?» ou quando ela lhe explica que casou com Brand porque «he stand», porque ele, ao contrário de Jimmy, não é homem para desistir ou fugir.
Passado esse prólogo, em que ficamos a saber do passado (um passado à Casablanca, só que foi o homem quem fugiu e não há flash-back), Brand, Leith e os seus homens partem para a missão. Brand porta-se sempre como cobarde. Leith é desmedidamente, romanticamente, herói. Como não estar do lado dele, do lado desse Richard Burton «terno guerreiro», novo demais na terra (embora ruínas do século X sejam demasiado modernas para ele), imponderavelmente belo e imponderavelmente comovente? Apesar dos comportamentos de malogro, como nessa noite no deserto («when or what») em que matou os vivos e salvou os mortos, como ele próprio diz. Do lado dele, não estive só eu e a generalidade dos espectadores. Todos os homens da companhia o amavam também, tanto quanto odiavam Brand, que nem sequer é capaz de assumir a antiga história entre a mulher e o subordinado e nem sequer é capaz de deixar claro que se vinga por ciúmes.
Até ao dia – sempre o deserto – em que Brand viu, distintamente, o escorpião que avançava na areia, em direcção à perna de Leith, adormecido. E não disse nada, nem fez nada. Picado pelo escorpião, Leith passou a ser um morto a prazo, e Brand um chefe cada vez mais desrespeitado e desprezado.
Por fim, Leith sucumbe. Deitado no chão, podre de gangrena, diz a Brand que, se ele não tem coragem para o matar, ao menos não o tente salvar. Depois, vem a tempestade de areia. E é durante ela que Leith brada o «I always contradict myself», quando cobre com o corpo agonizante o corpo do rival e assim lhe salva a vida, enquanto perde a dele.

Tudo do lado de Leith? Só muito mais tarde e muito mais velho, reparei melhor no assombroso diálogo entre os dois homens, antes da tempestade. Depois de ter chamado cobarde a Brand, Leith vai mais longe: «You’re not a man, but an empty uniform, standing by itself.» A câmara faz então uma leve panorâmica sobre o pesado corpo de Jurgens e este responde: «Yes. But I stand.» De novo, a câmara se volta para Burton, que olha o outro, espantado, e fica em silêncio algum tempo (só o vento, só o vento na banda sonora). Depois, muito devagar, em grande plano, filmado em plongée, Leith responde: «Yes... Yes... You stand... And, for the first time, I have some kind of respect for you. You’d better go.» Jurgens pergunta-lhe: «Anyone to notify?» «Mrs. Brand», responde, lentamente, Leith. «Diga-lhe que ela tinha toda a razão e eu não tinha nenhuma.» O vento volve-se em tempestade, Leith salva Brand e fica, no fim, o plano de Leith morto (o mais belo dos planos) com o vento nos cabelos.
Quando os sobreviventes da missão regressam a Bengazi, Brand informa Jane da morte de Leith. Mas, quando ela lhe pergunta se ele, antes de morrer, disse alguma coisa, o marido mente e não transmite a mensagem. Ou seja, deliberadamente oculta o que lhe podia servir de reabilitação, recusando-se a que a sua imagem seja recuperada pela mensagem póstuma de Leith. Diante dos homens e diante da mulher, assume o lado vil. Retira a condecoração que lhe deram e pendura-a num manequim, o tal uniforme vazio. Quem assim se obscurece, ilumina-se, como se iluminou para Leith, quando, ao desejo de morte e de desastre deste, opôs o desejo de vida e de vitória seu. Demorei anos a perceber que «eu fico» pode ser a coisa maior que um homem ou uma mulher tem para dizer ou para dar. E que, apesar de todas as aparências, Brand é um personagem mais forte do que Leith.

Como Godard dizia: «O que é o amor, o medo, o desprezo, o perigo, a aventura, o desespero, a amargura, a vitória? Qual é a importância disso quando olhamos as estrelas?»
Bitter Victory é um filme que nunca se substancia nem se substantiza. Tem o mais portentoso diálogo da história do cinema e as palavras não dizem nada. Tem a mais bela música de filme que alguma vez vi (Maurice Le Roux) e aquela música é um enigma. Tem a voz de Burton, o olhar de Burton, a beleza de Burton e talvez em coisas tão belas não esteja o essencial.
Não sei se é um filme para além das estrelas, como Godard dizia. Mas, nas noites e nos desertos cinemascópicos, a preto e branco, entre um homem que morre e um homem que fica, ambos perdidos no espaço sôfrego do grande formato, é um filme sobre qualquer coisa muito grande, situada muito longe. Foi ao vê-lo – é a vê-lo – que pude e posso perceber o que será esse de profundis donde clamamos para Ti.
João Bénard da Costa
Retirado daqui.

23/05/09

Caso Eurojust: Confused? You won't be, after the next week's episode of... fripór

Exercício para o fim-de-semana (com consulta de links)
A partir dos dados enunciados, defina pressão. A atmosférica não conta.


1. Olá! Fala-se em pressões...
2. Governo desmente andar por aí a pressionar as pessoas, ora essa!
3. Pinto Monteiro, PGR, nega a existência de pressões, era o que mais faltava!
4. PGR acaba pressionado e decide esclarecer o raio da "brincadeira estúpida" ou lá o que seja
5. Lopes da Mota jura, jura, jura que nunca pressionou ninguém na vida [já o Alberto Costa...]
6. Cândida Almeida, porventura "confundida", garante que não houve pressões
7. Maria José Morgado vem garantir que os corajosos não são pressionáveis [esta intervenção heróica surge um bocadinho metida a martelo no plot e confesso que não a entendi bem: porque lá por eu não ser pressionável não quer dizer que não me tentem pressionar - por exemplo, a história da Mafia está cheia de tipos não pressionáveis que acabaram mal]
8. Reune-se muito: ele é pressões para a esquerda, ele é pressões para a direita...
9. Com tanta pressão, lá se acaba por abrir um inquérito
10. Olá! O inquérito confirma pressões
11. A coisa aquece: inquérito transforma-se em processo disciplinar
12. Alberto Costa diz que demitir Lopes da Mota nem pensar, Pinto Monteiro que o demita se quiser
13. Pinto Monteiro devolve a batata quente, perdão, Lopes da Mota ao governo
14. O Eurojust sai da jogada do fripór por decisão de Pinto Monteiro
15. O Eurojust diz que já não jogava nesse campeonato desde 23 Abril, escusavas de ouvir esta!
16. Lopes da Mota, que terá usado os nomes de José Sócrates e Alberto Costa, poderá a vir ser pressionado, perdão, processado por ambos
17. Lopes da Mota garante que não invocou os nomes dos deuses em vão
18. Enquanto isto, o filho do tio de Sócrates continua a praticar kung fu na China e diz que antes do natal não pedirá desculpas ao primo
19. Ainda mal refeitos, eis senão quando, não se sabe bem de onde, Felícia Cabrita nos desencanta outro primo...
To be continued...

22/05/09

Detesto repetir-me mas com ou sem acordo ortográfico ainda há uma coisa chamada língua portuguesa

"No computador Magalhães (como é frequente na maioria dos computadores que se adquirem) trás consigo um amplo conjunto de software e aplicações."
[frase retirada de página do Ministério da Educação obscuramente intitulada Workshop "e-escolinha": usar as TIC no 1º ciclo... e é verdade que as coisas em "inha" sempre me irritaram]
Não sei se já reviram as asneiras do Magalhães, mas as citadas acima continuam online [estas e mais aqui, a partir daqui].

21/05/09

Da velha dicotomia forma vs conteúdo: porque há malta que brinca à democracia há pouco tempo apesar da Maizena que alguns terão comido em pequeninos

Notícias surpreendentes lá de fora: o primeiro-ministro belga, Yves Leterme, propôs hoje (19/12/08) a demissão de todo o Governo, na sequência de acusações de alegadas (alegadas, imagine-se!) pressões sobre a justiça. Leterme nega qualquer pressão sobre o poder judiciário e apenas admite ter feito "contactos"; Michael Martin, presidente da Câmara dos Comuns, anunciou hoje (19/05/09) a demissão, após acusações de alegadamente (alegadamente, pasme-se) ter consentido alegados (só alegados) abusos nas despesas de representação de alguns deputados; dois membros da Câmara dos Lordes foram hoje (20/05/09) suspensos (suspensos, a democracia inglesa está maluca!) por alegadamente (outra vez só alegadamente) terem aceitado dinheiro para votar projectos de lei.
Nenhum deles foi, pasme-se de novo, condenado por sentença transitada em julgado, e mesmo assim, pasme-se ainda mais, tiraram consequências políticas de alegações fundamentadas que os visavam. Então e aquela coisa da "presunção de inocência"? As democracias belga e inglesa têm que comer muita papa Maizena para chegarem aos calcanhares da nossa...
Manuel António Pina
Roubado, com 3 vénias, daqui.

20/05/09

Porque o Ferreira Fernandes me tirou as palavras da boca...

A professora parece-me maluca. Isso, em si, não quer dizer grande coisa: alguns dos melhores professores que tive eram tidos como malucos. Admito, ainda, que pela conversa da professora ela seja do tipo que seria aconselhável não frequentar garotos de 12 anos. Sobre ela, nada mais digo. Agora, esse escândalo levanta uma outra questão. No meu tempo, nós, os miúdos de 12 anos, comentávamos, entre nós, os professores malucos (as professoras malucas, também, mas, essas, era mais as pernas). Não se levavam as maluquices dos nossos professores aos pais e, muito menos, à rua e jornais. Nem estou a ver nenhum dos pais a pedir a um de nós: "Saquem-lhe [ao professor maluco] uma maluquice que sirva de prova..." Foi bom ter vivido os meus 12 anos antes da popularização do gravador, fiquei sem memória de experiência de espião a soldo. Vão dizer-me que a gravação da professora de Espinho vai permitir que ela deixe de dar aulas e que isso é bom. Tudo bem. Mas eu digo-vos que é melhor ainda que, aos 12 anos, eu não tenha tido quem me fizesse espião a soldo.
AQUI [imagem tirada do filme de ficção-científica Village of the Damned, 1960]

19/05/09

Manuel Alegre diz que por enquanto não verseja mas já a Margarida Moreira dá-lhe e dá-lhe forte

Manuel Alegre lá esclareceu o tabu: fica.
Porém, se o bardo histórico fica mas calado [pelo menos, por agora], o mesmo não se diga de Margarida Moreira, a tal senhora da DREN cujo português nem com 30 acordos ortográficos... Como bem resumiu Manuel António Pina "deu-lhe para o lirismo metafísico". E deu-lhe forte.
Poetisou, pois, a dita, diz-se que em agradecimento ao apoio demonstrado pelas escolas. Foi uma orgia em verso branco.
Eis a prova:

"Faz hoje 4 Anos.
Tem dias que parece que o tempo se emaranhou nas coisas e nas pessoas.
Tem outros dias em que tudo parece ter ocorrido ontem.
Contudo há algo que o tempo tem os limites certos." *

Note-se que para além da compreensão clara do emaranhado relativista einsteiniano, que aqui assume todo um pendor místico que nem o poema de Alegre "Ser ou não ser" alçança, Margarida também melhorou muito o português: "Contudo há algo que o tempo tem os limites certos."
E ainda há quem, surdo à alma lirica de Moreira, ouse gritar-lhe: "NON, TU NE CHANTERAS PAS ! NON, TU NE CHANTERAS PAS!"
[obrigada Tomás]

*Versão integral do e-mail de inspiração camoniana roubada daqui:
De: Margarida Moreira (DREN) [mailto:margarida.moreira@dren.min-edu.pt]
Enviada: segunda-feira, 11 de Maio de 2009 19:38 Para: Escolas Sede e não Agrupadas (DREN – Externo)
Assunto: 4 ANOS DE MANDATO
Caras e caros colegas Faz hoje 4 Anos (Surpreeeeeeesa).
Tem dias que parece que o tempo se emaranhou nas coisas e nas pessoas.
Tem outros dias em que tudo parece ter ocorrido ontem.
Contudo há algo que o tempo tem os limites certos:
- Foram quatro anos bons de amizade, de solidariedade e de prazer de poder contar com o vosso profissionalismo e apoio.
DA VOZ DAS COISAS
Só a rajada de vento
dá o som lírico
às pás do moinho
Somente as coisas
tocadas pelo amor
das outras têm voz.
Fiama Hasse Pais Brandão
Em nome da Direcção o nosso muito obrigado.


[E digo eu: coitada da Fiama!!!]

18/05/09

Eu vinha falar de coisas sérias mas oh caraças! o olhanense subiu à primeira divisão

Esclarecimento prévio: não faço ideia de quem seja o António Pina. Parece que é Presidente do Turismo do Algarve. Suponho que seja mais do Allgarve dado isto: Subida à primeira divisão terá impacto no turismo. Esclareço que me estou nas tintas para o impacto. Já não para isso do clube da minha terra ter voltado à primeira-divisão, mesmo se já não vejo futebol desde o dia em que um homem lindo de morrer chamado Zidane deu uma cabeçada num adversário, cena que, se pensarmos bem, podia ter sido tirada de um filme antigo do Scorsese.
Naturalmente, voltar à primeira-divisão não é a mesma coisa do que ser "Campeão do Algarve e de Portugal" como o foi o Olhanense em 1923/24. Mas para que não se ponham com piadas, deixo-vos com um naco de prosa retirado do nº11 da colecção Os Nossos 'Azes' do Foot-ball (Julho de 1924), dedicado ao jogador Raul Figueiredo, vulgo Tamanqueiro, jogador do clube da minha terra-natal.

"Cremos que foi Eça de Queiroz, esse espírito cintilante que marcou entre nós o advento da escola naturalista na nossa literatura, quem afirmou que Portugal... é Lisboa.
A afirmação sendo um pouco arrojada mas suficientemente argumentada pelo genial autor do Fradique Mendes, pode aplicar-se agora ao assunto que pretendemos abordar.
Queremos com isto tão somente demonstrar que o nosso biografado de hoje, sendo um dos mais completos estofos de jogador, é ainda quase desconhecido do público de Lisboa, a despeito de aqui ter efectuado uma série de jogos, todos eles conduncentes a uma apreciação que tem necessariamente de ser favorável ao simpático jogador do grupo Campeão de Portugal, em football.
Por isto mesmo, talvez, estamos convencidos que não faltará quem pretenda negar a classe do excelente jogador, modesto, quase humilde, que nós fomos encontrar no cais de Olhão, descalço e de calças arregaçadas, conduzindo cabazes com sardinhas, isto a despeito do tal profissionalismo que se diz existir no Algarve e que nós ainda estamos para saber onde é que existe. Note-se que nós falamos deste modo porque conversámos com todos os jogadores do Sporting Club Olhanense e que nos consta, nenhum deles possui rendimentos a não ser Francisco Montenegro, cuja família, aliás, tem meios próprios.
Fomos pois, propositadamente a Olhão colher elementos para a biografia de Figueiredo, mais conhecido pelo soubriquet de Tamanqueiro, que já agora será o nome porque o trataremos, visto ninguém em Olhão o conhecer pelo seu nome que não seja de Tamanqueiro.
O half-bach centro do Sporting Club Olhanense é um jogador forte, bem constitído e de um fôlego admirável.
O seu jogo afirma-se e impõe-se claramente pela precisão magnífica dos seus passes que são verdadeiramente modelares. Possui uma energia de ferro e uma colocação espantosa. Por isto mesmo, sendo um belo elemento na alimentação do ataque é um dos mais fortes, senão o mais forte esteio da defesa do grupo Campeão de Portugal.
Tem um shoot fortíssimo e seguro. As recargas são sempre perigosas e na marcação de penaltys é um marcador de primordial quilate. Tem um senão: a sua baixa estatura. Mas possuidor de um souplesse excepcional, os seus formidáveis saltos suprem quase a falta de estatura para o lugar que desempenha. O seu jogo de cabeça é verdadeiramente primoroso e matemático e as exibições que fez em Lisboa, nomeadamente a que fez na final do campeonato de Portugal contra o Football Club do Porto, são a segura garantia do que afirmamos. Possui uma grande mobilidade e pode dizer-se que é um primeiros dribleurs do país.
Como conseguiu então Tamanqueiro a sua classe bastante apreciável e que os seleccionadores têm de ter em atenção?
Pela intuição, simplesmente pela intuição. Tamanqueiro possui uma inteligência mais que modesta. Mas possui extraordinárias faculdades assimilativas que fizeram dele um dos primeiros players do país.
(...)"
E pronto. Viva o Sporting Club Olhanense!

17/05/09

Em resposta a D. José Policarpo e confessando a minha total miopia

Afirmou o cardeal-patriarca de Lisboa, por acasião da missa deste fim-de-semana no Terreiro do Paço, que "os habitantes da grande Lisboa têm essa particularidade: não precisam de entrar numa Igreja para rezarem diante de uma imagem do Coração de Jesus. Toda a cidade se transformou num templo, onde só não sente o amor de Cristo quem não quer".
Apenas queria dizer ao D. José Policarpo que não só nunca fui agraciada com o amor de Cristo como, abrindo-se as janelas da minha casa sobre o Tejo, a única coisa que consigo vislumbrar é um enorme mamarracho do outro lado do rio. O que não é coisa que me espante: afinal, a ideia de reproduzir em Almada o Redentor carioca nasceu na cabeça do cardeal Cerejeira, homem que não ficou para a História pelo seu sentido estético.

A book a day keeps the doctor away

Chama-se Funeral Divertido e é realmente divertido. Chega assinado por Liudmila Ulítskaia, escritora russa de quem já foram publicados entre nós Sónetchka (Campo das Letras), premiado em França com o Médicis para a melhor novela estrangeira, e, como este também na Relógio D’Água, Mentiras de Mulher.
Ulítskaia é russa e nota-se. Nascida em 1943 na antiga URSS no seio de uma família judaica, formou-se em biologia mas acabou por ser despedida do emprego por “posse e divulgação de literatura proibida”. Trabalhou em teatro e cinema e, na década de 80, lançar-se-ia na ficção. Diz a própria que a sua conversão à escrita aconteceu para poder continuar a viver no apartamento de Moscovo que partilhara com o primeiro marido, também dado às letras, na então Casa dos Escritores. Verdade ou mentira, o facto é que Ulítskaia manteve a casa e os leitores saíram a ganhar.
Funeral Divertido reúne na cidade de Nova Iorque um grupo de personagens improváveis (uma curandeira de regresso à Rússia por falta de documentos, uma ex-amante e ex-artista de circo, um médico emigrante sem licença, uma adolescente “esquisita”, uma esposa desesperada por um baptismo…), cujo elo, para além da origem russa comum, é Álik, pintor judeu emigrado na América que abandonou o hospital para ir morrer a casa, um estúdio caótico onde há sempre gente a entrar e a sair (como numa peça de teatro), se bebe vodka como se fosse água, se rememoram episódios do passado e se convive com as novidades da pátria seguindo-a pela CNN. No meio disto tudo, entram ainda em cena um padre ortodoxo e um rabino, o primeiro trazido por Ninka, a mulher de Álik que não o quer ver morto antes do baptismo; o segundo, uma exigência do próprio: “Álik sorriu debilmente: ― Está bem, traz o teu pope. Com uma condição: tens de trazer também o rabino. Ninka ficou petrificada: ― Estás a brincar? ― Porquê? Se exiges de mim um passo tão sério, tenho direito a uma consulta bilateral…».
Com diálogos de grande vivacidade, construção jazzística e personagens grandiosos na sua “irrealidade”, Funeral Divertido é um daqueles livros que podia ser arrumado algures entre os textos de Gogol ou de Isaac Bashevis Singer, um quadro feliz de Kandinsky ou um delírio de Fellini. Absurdo, trágico, terno, a rebentar de vida pelas costuras apesar da morte anunciada.

15/05/09

Ainda o Magalhães mas sem música

Alguém reparou que, enquanto a Comissão Europeia multa a Intel, cá no burgo a JP Sá Couto cresceu mais de 3000% com o Magalhães, computador que, por acaso, é uma versão do Classmate da Intel?
O projecto nascera na cabeça de Nicholas Negroponte e chamava-se OLPC. Depois a Intel abarbatou-se com a ideia e pô-la a render com o nome de Classmate PC. Em Portugal, uma empresa chamada JP Sá Couto, por acaso acusada de fraude e fuga ao IVA, juntou-se à Intel e traduziu a ideia para português chamando-lhe Magalhães. Um primeiro-ministro engenheiro juntou o Estado ao negócio e foi ainda mais longe baptizando a ideia [de Negroponte, recorde-se] de "ibero-americana".
No entretanto, a JP Sá Couto subiu as vendas em três mil por cento. E, no entretanto também, a Intel é multada em mais de um milhão de euros (a maior multa alguma vez aplicada pela União Europeia) devido às suas práticas monopolistas.
No meio disto tudo, há uns empreendedores menos ambiciosos do que os irmãos Sá Couto que tentam fazer dinheiro com o Magalhães, surripiando-os às criancinhas e vendendo-os nas Feiras da Ladra. E esta é, obviamente, a parte cómica da coisa. Mas quem é que, em época tão absolutamente desengraçada, ainda consegue achar graça aos Feios, Porcos e Maus?

14/05/09

Isto nunca poderia ter sido filmado no Pinhal Novo, apesar do magalhães que elas levam às costas



E como é longa a Rue Montorgueil... No Pinhal Novo tinham sido paradas antes da primeira esquina.

Afinal houve milagre e não foi o do azeite da fritadura de peixe: Ali Agca quer tornar-se português depois de ter cumprido o 3º milagre de Fátima!

"Voglio diventare cattolico, farmi battezzare in Piazza San Pietro e proclamare la mia nuova fede davanti ai media di tutto il mondo(...)
Stiamo facendo dei passi nei confronti del governo portoghese. Mi piacerebbe prendere la cittadinanza. In Portogallo, a Fatima, c' è la statua della Madonna di Fatima cara a Wojtyla. Papa Ratzinger ha spiegato che l' attentato da me condotto costituiva il famoso Terzo segreto. Ecco perché ho scelto il Portogallo." [mais aqui]
E para quem não sabe [ou já esqueceu] quem é o Ali Agca... clicar aqui sff.

12/05/09

Palavras para quê? É a massa cinzenta a dar o melhor de si

Nunca fui ao Bairro da Bela Vista. Imagino que não seja muito diferente de outros guetos urbanos que por aí existem, em Portugal e no estrangeiro que a modernidade não tem fronteiras. Perante a recente explosão de violência que assolou o dito, notei a propósito alguns comentários supinamente inteligentes.
José Sócrates saiu-se com mais uma daquelas frases de efeito: Nos Estados democráticos não se ataca a polícia. Bom, não sei quem foram os professores de História do primeiro-ministro, mas a verdade (histórica) diz precisamente o contrário: é nos Estados democráticos que a polícia é mais atacada (nos outros já foi tudo engavetado no entretanto…).
Para ajudar à festa, surgiu depois Jerónimo de Sousa garantindo alto e bom som que primeiro tem que se resolver a situação económica e social e as discriminações sociais, afirmação que, se os moradores da BelaVista perdessem tempo a ouvir Jerónimo de Sousa, os teria deixado certamente em estado de choque pelo que contém de condenação eterna ao Far West.
E, na escala da profundidade analítica, tivemos ainda direito a coisas tão sábias como: Os meninos querem carro topo de gama, roupa de marca e muito dinheiro na carteira. Mas não querem estudar nem trabalhar. O ideal seria um “maná” mas isso foi no Antigo Testamento e de temor a Deus só aquelas cruzes enormes que usam ao pescoço.
Se uns teriam que ver o Viridiana para perceber que ser pobrezinho não garante necessariamente um lugar no céu dos explorados e oprimidos, e outros teriam de, no mínimo, imaginar-se adolescentes a viver nos bunkers setubalenses, ao primeiro-ministro talvez lhe bastasse umas lições de História.
Mas o que nenhum dos acima citados gostaria era, certamente, de viver no Bairro da Bela Vista. Já agora, nem eu. E, também por isso, é que me fazem espécie tantas banalidades.
* Uma nota: depois de escrever isto, encontrei isto. E que bem que me soube!

11/05/09

Nostalgias em cadeia ou vice-versa



Não sou nada obediente. Apesar disso, gosto imenso daquela frase do Rantanplan em que ele diz: «Finalmente alguém que sabe mandar!».
O Pedro Correia, do Delito de Opinião, passou-me uma corrente: 15 séries de televisão que me tivessem ficado na memória. Raramente alinho em correntes mas o e-mail do Pedro acabava assim: «É mesmo para responder, está bem?»
E, vai daí, obedeço.

Columbo (com o fabuloso Peter Falk)
Hitchcock Apresenta (lembro-me sempre do episódio em que os polícias acabavam a lambuzar-se com a arma do crime)
Space 1999 (o guarda-roupa era imbatível)
Bonanza (ainda hoje sei trautear a música do genérico)
Eu, Cláudio (uma versão literal do "estes romanos são loucos!")
Soap (quando os temas fracturantes tinham graça)
Monty Phyton Flying Circus (com carneiros a cair em cima do apresentador do telejornal…)
Twin Peaks (embora, a partir de dada altura, aquilo nunca mais acabasse)
A Visita da Cornélia (será que sobreviveu ao tempo?)



Os Vingadores (o glam ao serviço de Sua Majestade)
A Música e o Silêncio (o António Vitorino d’Almeida sem a Bárbara)
Homem Rico, Homem Pobre (com o Nick Nolte)
Seinfeld (muito, muito feios, mas com muita, muita graça)
Casei com uma feiticeira (por causa do nariz, claro)
Casarão (lembro-me que a Elis Regina cantava "Fascinação" no genérico e aquilo era mesmo de fazer chorar as pedras...)
[nota: a ordem é aleatória e tive de me esforçar muito, mas, entretanto, ainda podia acrescentar o Blackadder, com o Mister Bean a contracenar com o Dr. House, a Balada de Hill Street, que ficava mais ou menos no bairro da Bela Vista lá do sítio, ou o Detective Cantor, como é que me fui esquecer dessa?]

10/05/09

A book a day keeps the doctor away

Trinta e cinco anos passados do 25 de Abril de 1974, a editora Bizâncio reúne em livro – e à mesa – três portugueses e um belga de origem portuguesa que, entre amêijoas, bacalhau e outros pitéus, desatam memórias do antigamente.
Combatendo a amnésia que permitiu ainda há cerca de duas semanas baptizar um largo com o nome de Oliveira Salazar (e um acrescento: a autora desta nota, assim como assim, sempre compreende melhor os alemães que continuam a macerar o Hitler…), À Espera de Godinho é um livro de petites histoires através do qual conseguimos espreitar a História.
A primeira coisa que o leitor perguntará é: quem é Godinho? Pois, confesso que fiquei sem saber. Sei apenas que, não sendo certamente Godot, também ele se esgota na ameaça: nunca chega. Mas ainda assim se janta. À mesa: Amadeus Lopes Sabino, advogado, Manuel Paiva, físico naturalizado belga, José Morais, neuropsicólogo, e Jorge de Oliveira e Sousa, politólogo. Nasceram os quatro na década de 40 do século XX e foram todos exilados do regime salazarista. Continuam lá fora. Com percursos diversos, têm esse traço comum: recusaram a guerra colonial e as varizes do Roque do O’Neill, e zarparam precocemente rumo à democracia onde refizeram a vida alheados deste “jardim à beira-mar plantado”, o qual nunca confundiram com o “jardim das delícias” nem sequer depois de o terem pejado de cravos.
O livro não se esgota, porém, na rememoração dos velhos tempos, nem nas peripécias do que era, então, a resistência. O mundo hoje, a Europa hoje, a utopia hoje, a solidariedade hoje, Portugal hoje – eis alguns dos temas que também o atravessam, entrelaçados num viveiro de lembranças, divertido e dramático, amargo e positivo – cabe ao leitor escolher o menu.
Cultos e cultivados, é um prazer seguir a conversa destes quatro personagens, se não à procura de um autor pelo menos de um sentido. Concorde-se ou não com tudo aquilo que dizem. Especialmente, porque a nenhum nos apetece responder aquilo que Napoleão terá respondido a um general que, prontificando-se a retirar uns mapas de uma prateleira alta, fez notar ao Imperador: “Sire, eu sou maior”. Napoleão corrigiu-o: “Não general, o senhor não é maior, é só mais alto”. E também destas deliciosas histórias se faz À Espera de Godinho.

08/05/09

Para ler durante o fim-de-semana que o texto é difícil mas certamente sábio e o Lacan comparado com isto é um figo e dos maduros!

«Uma das questões que se discute, no plano da acção e da transposição didáctica bem como no âmbito da do ensino da gramática, é a que põe a tónica no princípio do faseamento e da progressão dos conteúdos. Não se tratando de uma questão ou um princípio monolíticos, ao nível quer da conceptualização quer da operacionalização, ela complexifica-se pela articulação com finalidades distintas do ensino da gramática: entre a consciência da implicação e da acção pedagógica-didáctica que releva a dimensão científica da gramática - enquanto espaço de reflexão e de construção autónomos de conhecimento declarativo sobre o(s) conhecimento(s) da língua - e a percepção do seu estado funcional ao nível dos usos e das situações concretas de produção (orais, escritos, literários e não literários), geradores, também, de padrões de modificação e de criação linguística.
A progressão como passagem do simples para o complexo, como orientação do familiar ou frequente para o desconhecido ou menos comum, como transição do genérico para o específico não pode desconsiderar o critério de utilidade e do se revela necessário para determinadas opções discursivas, certos objectos comunicativos que implicam o conhecimento e a explicação de alguns dados da língua.
Neste sentido, qualquer posição a ser assumida beneficiará de uma perspectiva multifocalizada por parte dos que trabalham o conhecimento explícito ao longo dos diferentes ciclos e níveis de ensino-aprendizagem.
Alguns exemplos, centrados nos domínios da Morfologia, da Sintaxe, da Análise do Discurso e da Linguística Textual, permitirão equacionar alguns destes pontos relativamente ao discurso pedagógico bem como à progressão no ensino-aprendizagem do conhecimento explícito da língua (materna) no actual contexto de discussão e de revisão / implementação de novos documentos reguladores das práticas docentes».
[Texto assinado por altos responsáveis pelo futuro do ensino do português e roubado daqui]

07/05/09

A propaganda dá sempre merda!

Estou francamente farta do assunto. Que volte a ele significa que a propaganda resulta. Num mundo ideal não devia. Não vivemos num mundo ideal. Ah! pois é.
O último 1º de Maio gerou um "não acontecimento". As escaramuças entre Vital Moreira e alguns participantes da manifestação convocada pela CGTP para a data transformaram-se num caso nacional, e até o primeiro-ministro veio dizer que se tratara de "uma vergonha para a democracia".
Uma onda de indignação varreu o país porque o candidato europeu fora injuriado, esmurrado, pontapeado, enfim, ferido no mais fundo da sua alma e à superfície da epiderme também.
Até hoje, não vi nenhuma imagem que comprovasse tais factos. Mas, como diria Goebbels, um mestre da propaganda, uma mentira repetida muitas vezes torna-se verdade.
Saramago, diz-se que convertido já na terceira-idade aos valores democráticos, cumpriu o seu papel de bardo e falou alto.
Num artigo em que a partir do segundo parágrafo desata a referir-se a si próprio na terceira pessoa, como se do rei de Espanha se tratasse, e, significativamente intitulado "Expulsão", pede identificações e exige purgas.
Entretanto, vão-se trocando galhardetes em praça pública, pedidos de desculpa, mais galhardetes e mais pedidos de desculpas. Não se trocam bengaladas nem sapatos.
Depois alguém vem acrescentar que, pelo menos um dos arruaceiros, não era do PCP. Era do Bloco de Esquerda. Dão-lhe nome. Dão-lhe rosto. Rosto que o BE terá apagado do seu site, à semelhança do que Estaline fizera a Trotsky.
Chegada aqui, perdi-me.
Perdida, só quero dizer o seguinte porque eu cá não nasci das ervas: mentir é muito feio, andar à cata de pessoas é muito feio, denunciar é muito feio... e brincar com o Photoshop também, pelo menos às vezes.
Quanto ao Goebbels, que sem dúvida era um mestre, acabou mal. O pior, claro, tinha sido o resto.

06/05/09

As frases de Manuel Pinho sairão na farinha Amparo?

Há mistérios na vida e não me refiro à virgindade de Maria. Antes às razões, naturais ou sobrenaturais, que justificam a presença de Manuel Pinho no governo. Num governo. Em qualquer governo. Mas pronto, há que saber aceitar os limites do entendimento humano, como diria Garrett, perdão, David Hume.
Vem isto a propósito do referido ministro ter acabado de acrescentar mais uma máxima à sua já muito considerável colecção de frases memoráveis. Disse ele: "O doutor Paulo Rangel ainda tem de comer muita papa 'Maizena' para chegar aos calcanhares do doutor Basílio Horta".
Deixo de lado os doutores, cujos nomes são igualmente obscuros para mim. Mas COMER MAIZENA?!!! Não seria antes, "comer muito pão", "cerelac", ou quiçá "nestum"?
Posso estar enganada. Mas, pelo menos cá em casa, só usamos a Maizena para bolos ou para fazer molho branco. E, ainda assim, preferimos a "Nacional".

04/05/09

Bengaladas III [e não, nunca fui de andar à pancada, nem nos meus tempos de perigosa extremista]

Já estava noutra. Mas quando dei com as notícias
1. Manuel Alegre condena incidentes com Vital
2. José Lello garante que "afinal, há sempre uma voz que se cala"
[e note-se o sentido poético do segundo, paradoxalmente ausente do primeiro]
.... achei que ainda havia matéria para continuar o folhetim.
Deixo-vos com as imagens. E das duas uma: ou o operador de câmara, com medo de ser processado pela CGTP, omitiu a parte dos pontapés, murros e estaladas, ou então o que eu vejo neste vídeo fica-se por aquela coisa tipicamente portuguesa do "agarrem-me senão vou-me a ele!".
A segunda hipótese, terão de convir, é mais provável. Só por isto:
Vital já não é jovem. E um dia depois da "brutal agressão" estava a fazer rafting no Minho.
Tudo indica, pois, que ainda não foi desta que o jurista de Vilarinho do Bairro teve a sua "Marinha Grande".

03/05/09

Ainda a propósito de bengaladas [roubado com todo o descaramento e eu só assino por baixo]

Sócrates foi assobiado em Melgaço quando fazia campanha eleitoral. Sócrates disse que era normal em democracia. Já os insultos a Vital, não. Sócrates explicou que quem insulta Vital tem que pedir desculpas ao Partido Socialista. Peço já desculpas ao Partido Socialista.
Daqui.

02/05/09

Oh! o antiquíssimo método das bengaladas

[...]
O orador (concluindo): – E foi assim, sr. presidente que se passaram os factos.
O Sr. Luciano de Castro (interrompendo com grandes punhadas na mesa): – O ilustre deputado tem estado simplesmente a dizer refinadíssimas petas...
Vozes: – Apoiado, apoiado!
O orador (voltando-se e desabotoando o colete): – Petas? oh! formidável patife! (apoiado, apoiado). Eu, sr. presidente, não posso consentir que esse celerado entre no meu foro interior!
Vozes: – Fora, fora!
Uma voz suplicante: – Sr. presidente, estão-me aqui a dar pontapés (sussuro).
O Sr. Coelho do Amaral (espancando com grande dignidade o Sr. Barros e Cunha) : – E aqui está, sr. presidente, como se prova que o Sr. Barros e Cunha não tem razão alguma nos princípios que estabeleceu.
O Sr. Mariano de Carvalho: – Mas a ditadura foi nefasta! E não há biltre nenhum que me prove o contrário... (tira o casaco).
O Sr. Coelho do Amaral (continuando o espancamento): – Não me interrompam o discurso!
O Sr. Presidente (aos Srs. Mariano e Santos Silva): – Os senhores não têm direito a interromper sovas que o regimento garante (berreiro).
O Sr. Presidente do Conselho: – A Câmara está-se sepultando na mais profunda abjecção!
(O sr. presidente do Conselho sucumbe, sob uma chuva de bengaladas).
O Sr. Braamcamp (batendo com a bengala sobre a mesa, a um continuo) :–Dois cafés! Um cabaz!
Vozes (atravessando o corpo legislativo). –Salta, meia de Colares!
O Sr. Pinheiro Chagas (deitado, fumando com ar melancólico):

«Oh virgem pálida e triste
Branca visão doutros Céus!»

O Sr. Aires de Gouveia: – O que diz ele?
Vozes: – Ele cisma! Ele cisma!
A oposição atira cebolas ao Sr. Pinheiro Chagas. Alguns senhores deputados dizem obscenidades, que o ruído impediu que chegassem à mesa dos taquígrafos.
O orador: – A Câmara não quer escutar-me? Pois bem, eu passo a outros argumentos... (Distribui bengaladas).
Tumulto. O sr. presidente atira a campainha à cara da maioria, e o tinteiro aos queixos da oposição. Alguns senhores deputados miam de gato. O Sr. Santos e Silva, no auge da sua indignação dá cambalhotas. O Sr. Jota Moniz, no seu zelo pelos princípios, retira-se da sala. O Sr. Luís de Campos termina por distribuir, bem a seu pesar, uma prodigiosa quantidade de pontapés, com uma nobre imparcialidade.
O Sr. Presidente: – Para amanhã continua esta interessante discussão.
A Câmara sai correndo, gritando, rebolando pelas escadas abaixo.
Os contínuos levantam as garrafas de Colares.
[...]
in As Farpas, Eça de Queirós e Ramalho Ortigão
Imagem encontrada aqui.

01/05/09

A ética, esse empecilho [a incluir na série homens de quem gosto muito]

«Face às críticas dos pais que acusam os inspectores do ME que inquiriram alunos da Secundária de Fafe acerca de uma manifestação contra a ministra de terem utilizado, nos interrogatórios dos jovens, métodos "absolutamente inconcebíveis depois do 25 de Abril" e os terem incitado a acusar e denunciar os seus professores, defende-se a Inspecção-Geral da Educação dizendo que tudo o que fez foi "legal".
Juntamente com o "cumprimento de ordens", a "legalidade" sempre foi (foi-o em momentos sórdidos do século XX e continua a sê-lo) a explicação mais à mão para justificar o injustificável. Como se só o que é ilegal fosse condenável. Os inspectores do ME terão contudo lido Jellinek na Faculdade e saberão que o direito é apenas o "mínimo ético" (e conhecendo nós quem faz as leis, podemos ter uma ideia de quão eticamente mínimo é esse mínimo…).
Ora talvez a um ministério da "Educação" seja exigível, nas relações com escolas e com jovens, um pouco mais ― a não ser que no Ministério se esteja em greve à ética ― que o cumprimento de serviços mínimos éticos. Mas, se calhar, sou eu que estou a ver mal a coisa.»
* A imagem do Miller's Crossing (História de Gangsters, em português) é só porque além do Gabriel Byrne estar lindo nesse filme e de o Albert Finney ser um actor do caraças eu achar que os irmãos Cohen são responsáveis pela melhor história sobre ética jamais passada ao cinema.